Capítulo 3: Igualdades exponenciais e logarítmicas
Neste capítulo, explicaremos porque são válidas as identidades exponenciais mencionadas na introdução deste texto. As igualdades que usualmente definem as funções trigonométricas hiperbólicas, como soma de exponenciais,
Como sabemos, o logaritmo é a função inversa da função exponencial, com a devida restrição no domínio e na imagem. É natural então pensarmos que as funções trigonométricas hiperbólicas inversas possam ser escritas como logaritmos. Isto de fato ocorre e também mostraremos como são obtidas as fórmulas
Identidades similares às identidades em (3.1) e em (3.2) também são válidas para a trigonometria circular. Entretanto neste caso será necessário o envolvimento de variáveis complexas.
3.1 Método das séries de potência
O método que utilizaremos para provar as identidades em (3.1) nesta seção é o método das séries de potência e então faremos primeiramente uma breve introdução às séries de potência de variáveis reais. Para um estudo mais aprofundado sobre séries de potências recomendamos [8, Swokowski].
Observe que o primeiro termo da série é . Para simplificar a notação, estamos supondo que mesmo para .
Se a soma infinita existir e for um número real , então dizemos que a série converge, ou ainda, que converge para . Se a soma não existir então a série é dita divergente. Naturalmente a convergência de uma série de potências está condicionada aos termos e principalmente ao valor da variável .
Observe que para a série se reduz a um único termo e, portanto, é uma série convergente (para ). O que realmente interessa é se existem outros valores de , além de , para os quais a série de potências é convergente. Nestes termos um fato importante é a determinação dos valores de que tornam uma série de potências convergente, isto é, determinar os valores de para os quais a soma infinita existe.
O conjunto dos valores de que tornam a série convergente é um intervalo, centrado em 0 e com raio . É um intervalo do tipo , podendo ainda ser fechado em algum dos extremos. Para determinar este intervalo usamos, em geral, o chamado teste da razão (Critério de D'Alembert).
Se , a série é absolutamente convergente (e, portanto, convergente). | |
Se , a série é divergente. |
Para os valores de que tornam a série convergente, definimos uma função , cujo domínio é o intervalo de convergência da série. O recíproco disto é uma pergunta mais interessante. Dada uma função definida em algum intervalo , é possível obter uma série de potências de forma que para todo ? Mais ainda, se existir tal série, como devem ser os coeficientes ? A segunda pergunta é respondida pelo teorema de Maclaurin.
para todo , então é uma função infinitamente diferenciável no ponto e mais ainda,
Este teorema nos diz principalmente que os coeficientes , da série de potências de uma função, são respectivamente , sendo que a notação refere-se à derivada de ordem da função .
Para exemplificar o processo, vamos obter as séries de potência de algumas funções de interesse como , , , e , assumindo que estas funções admitem uma representação em série de potências em algum intervalo . Este não deve ser um trabalho difícil neste momento pois conhecemos as derivadas destas funções. Assim, parece não haver problemas significativos para a determinação dos coeficientes das séries de potências destas funções.
Primeiramente, vamos à série de potências da função . Esperamos encontrar uma série de potências em , de forma que,
De acordo com o teorema de Maclaurin, devemos ter para todo . Como sabemos, a função exponencial possui derivadas de qualquer ordem contínuas e mais ainda para qualquer . Então os coeficientes da série de Maclaurin ficam
e assim temos que
Podemos determinar (pelo teste da razão) que a série do lado direito converge para todo , já que para qualquer ,
e, portanto, a igualdade (3.3) é válida para todo .
Consideremos agora a função . Queremos determinar os coeficientes para todo . Dos resultados dos capítulos anteriores, temos que se é par, e se é ímpar . Desta forma, os coeficientes são dados por
Substituindo estes coeficientes na série de potências temos que
A série do lado direito converge (pelo teste da razão) para qualquer , pois para todo temos
e, portanto, a igualdade (3.4) é válida para todo real.
Com raciocínio similar desenvolvemos a série de potências para a função . Lembremos que agora, se é par e se é ímpar. Então, contrariamente ao caso anterior,
Desta forma, temos
sendo também esta igualdade verdadeira para todo .
Dada agora a função , queremos determinar para todo os coeficientes da série de potências de . Dos resultados anteriores, sabemos que se é par, e se é ímpar . Desta forma, os coeficientes são
Observe que os termos para ímpar, são alternadamente 1 e -1. Substituindo estes coeficientes na série de potências temos que
A série do lado direito converge (pelo teste da razão) para qualquer , já que
para qualquer . Segue que a igualdade (3.6) é válida para todo real.
Com raciocínio similar a este abordamos a função . Lembremos que, se é par e se é ímpar. Então, contrariamente ao caso anterior,
Desta forma, temos
sendo também esta igualdade verdadeira para todo .
Vamos usar agora as séries de potência obtidas anteriormente para verificar a validade das igualdades em (3.1). Consideremos primeiro a série de potência da função exponencial em 3.1,
válida para todo . Naturalmente se substituirmos na série por obtemos a série de potências para a função . Isto também pode ser feito como anteriormente, determinando-se os coeficientes para a série de potências da função . Isto nos leva aos coeficientes . De qualquer forma teremos
para todo . Somando as série de potências de e de obtemos,
Agora lembremos que a série do lado direito é exatamente a série de potências da função cosseno hiperbólico (Ver (3.5)). Desta forma temos que
donde segue que
Por outro lado, fazendo a diferença entre as séries de potências das funções e , temos
e lembrando que o lado direito é a série de potências da função seno hiperbólico (Ver (3.4)), temos que
donde segue
Fica assim verificada a validade das fórmulas exponenciais, que são comumente utilizadas para definir as funções trigonométricas hiperbólicas. Com estas duas igualdades, podemos escrever as demais funções trigonométricas hiperbólicas também em termos da função exponencial. São
para | ||
para | ||
para | ||
para |
3.2 Método das equações diferenciais
Nesta seção, provaremos as identidades em (3.1) usando o método das equações diferenciais. Precisamos naturalmente alguns resultados em relação às equações diferenciais. Para um estudo mais aprofundado sobre equações diferenciais recomendamos [10, Zill].
Definição 3.4 Uma equação diferencial ordinária, de ordem , é uma equação que envolve uma variável real independente , uma função e suas derivadas , de forma que o coeficiente de seja não nulo.
São exemplos de equações diferencias ordinárias:
Definição 3.5 Uma equação diferencial ordinária linear, de ordem , é uma equação diferencial que seja linear nas componentes , para todo . É uma expressão da forma,
Definição 3.6 Qualquer função , definida num intervalo , que satisfaz a equação diferencial neste intervalo, é dita uma solução para a equação diferencial em .
As funções , e (), são soluções das equações diferenciais (3.8), (3.10) e (3.11), respectivamente. A solução da equação diferencial (3.9) é dada implicitamente por , para .
Embora a ideia seja bastante simples, encontrar uma solução para uma equação diferencial dada, não é tarefa simples. Os métodos conhecidos nos permitem determinar soluções de uma classe muito pequena de equações diferenciais. Mesmo assim, algumas destas equações não possuem solução explícita.
Não é do nosso interesse estudar aqui os métodos para obtenção de soluções de uma equação diferencial. Entretanto é importante saber que nem sempre uma solução para uma equação diferencial é única. Podemos verificar que a função
é uma solução da equação , para quaisquer valores reais de e . Para podermos determinar os valores de e são necessárias informações adicionais, chamadas de condições iniciais. Como veremos mais tarde, dentro de certas hipóteses, uma equação diferencial munida de condições iniciais possui solução única.
Definição 3..7 Um problema de valor inicial, ou PVI, consiste de uma equação diferencial ordinária, de ordem , juntamente com restrições. Tais restrições são chamadas de condições iniciais. É um problema da forma,
Cuidado para não confundir um PVI com uma equação diferencial. Um PVI é um conjunto de uma equação diferencial juntamente com condições iniciais.
Como exemplo, vamos agora considerar a equação diferencial de ordem 2, mencionada anteriormente , a sua “família” de soluções dada por e impor duas condições iniciais que permitirão determinar os valores de e . Tomemos o PVI,
e substituindo as duas condições iniciais, temos que
e | ||
o que nos leva a uma única solução do PVI dado, que é
O próximo teorema, é a chave para o nosso objetivo. Sua demonstração é que não é do nosso interesse, pois além de não ser o objetivo principal deste capítulo, é um tanto complexa e exige ferramentas que não abordamos como por exemplo o teorema de ponto fixo de Banach. Desta forma, vamos omitir a sua demonstração. O leitor interessado nesta demonstração poderá consultar algum texto de Equações Diferenciais (ordinárias). Sugerimos [10, Zill].
Agora estamos prontos para estabelecer as identidades mencionadas no início deste capítulo. Para isto, consideremos primeiro o problema de valor inicial, definido em ,
Notemos que a função
é solução do PVI dado. Mas, do que vimos nos capítulos anteriores a respeito das funções trigonométricas hiperbólicas, a função , satisfaz a equação diferencial, pois
para todo real e, além disso, satisfaz as duas condições iniciais,
donde temos que é também uma solução do PVI. Mas o Teorema de Picard, garante que a solução deste PVI é única e, portanto, as duas soluções coincidem para todo , isto é,
qualquer que seja .
Para a segunda fórmula em (3.1), consideremos outro problema de valor inicial, também definido em ,
Observe que, comparando com o PVI anterior, apenas trocamos as condições iniciais. Nestes termos, a função
é solução deste novo PVI. Entretanto, do que vimos nos capítulos anteriores, a função também satisfaz a equação diferencial,
para todo real e as duas condições inicias,
e, dessa forma, também é solução do PVI, para todo . Do Teorema de Picard, segue que as duas soluções coincidem para todo , isto é,
para todo .
3.3 As fórmulas logarítmicas
Esta seção é dedicada à obtenção das igualdades logarítmicas em (3.2), além das igualdades correspondentes às outras quatro funções trigonométricas hiperbólicas inversas.
Dados de forma que , já sabemos que é válida a relação
Vamos isolar no segundo membro e obter uma expressão para em termos da variável independente . A igualdade anterior, nos leva a
Multiplicando ambos os membros por e reorganizando os termos temos
que é uma equação quadrática na expressão . As soluções desta equação quadrática, são dadas por
Temos que descartar uma das soluções porque o lado esquerdo da igualdade acima é sempre positivo e o termo é sempre negativo já que . Tomando então a solução positiva temos e aplicando logaritmo (natural) em ambos os membros,
para todo .
Para o cosseno hiperbólico inverso, consideramos e a relação inversa , válida para todos e . Como antes, tomemos a identidade
e vamos isolar no segundo membro. De forma análoga ao caso anterior, multiplicamos os dois membros por , reorganizamos os termos e chegamos a
e resolvendo esta equação quadrática em termos de temos
Observamos agora que os dois termos a que se refere o segundo membro são positivos e, portanto, não há impossibilidades matemáticas para aplicar o logaritmo. Entretanto lembremos que e isto siginifica que . Mas para temos que
e desta forma .
Descartando esta inconsistência, tomamos e aplicando o logaritmo em ambos os membros, temos
Já provamos as duas fórmulas indicadas no início deste capítulo. Contudo, vamos completar o trabalho e obter as fórmulas em termos do logaritmo para as demais funções trigonométricas hiperbólicas.
Consideremos e a relação inversa
válida para e . Organizando os termos temos
e multiplicando ambos os membros por e reorganizando em forma de equação quadrática, chegamos a
que resolvida em termos de fornece
Como o primeiro membro é sempre positivo, então descartamos a solução negativa. Observemos também que como então a fração dentro da raiz quadrada é sempre positiva, o que não acarreta mais inconsistências. Aplicando então o logaritmo, temos que
para todo .
Agora a cotangente hiperbólica inversa. Tomamos , para todo , com e então
Como no caso da tangente hiperbólica, reorganizamos os termos e multiplicamos por ambos os membros e chegamos a
e resolvendo esta equação quadrática em temos
Note que a fração dentro da raiz quadrada é sempre positiva para . De fato, o numerador e o denominador são ambos negativos no intervalo e são ambos positivos no intervalo . Vamos descartar a solução negativa, pois o lado esquerdo da igualdade é sempre positivo. Assim, tomando a solução positiva e aplicando logaritmo em ambos os membros, vem
Para a secante hiperbólica inversa, fazendo , para todo , com , temos
Após reorganização dos termos e multiplicação por , obtemos a equação quadrática
que resolvida em termos de nos traz
Notemos que para ocorre e, portanto, não temos problemas com a raiz quadrada. Entretanto, para temos e então
donde temos que e, portanto, . Mas isto é inconsistente com o primeiro membro , que é maior ou igual a 1, já que . Só não seria inconsistente caso os dois termos fossem iguais a 1, isto é , que somente ocorre se e . Mas a igualdade também se verifica para e e, portanto, podemos descartar totalmente a solução .
Tomando então a solução que não apresenta inconsistências, tomamos
e aplicando o logaritmo, temos
Finalmente, considerando e a relação inversa
válida para todos e . Procedendo como no caso da secante, obtemos a equação quadrática
que resolvida em , nos fornece
Notemos que como antes, queremos que o membro da direita seja positivo, pois o da esquerda o é. O termo é sempre maior que 1. O numerador assume portanto valores positivos considerando , e valores negativos considerando . Mas como temos que o denominador também assume valores positivos e valores negativos. Então se , devemos considerar a solução
e se , devemos considerar a solução
Podemos ainda obter uma única expressão válida para os dois casos. Observe que se podemos escrever
e se , podemos escrever
Assim, para qualquer , escrevemos
e aplicando o logaritmo, temos
que é válida para todo .
A tabela abaixo reúne as fórmulas desta seção.
Note que as fórmulas de derivação das funções trigonométricas hiperbólicas inversas, foram obtidas na seção 2.8 e resumidas na tabela 2.4. Naquela seção foi utilizado o método da diferenciação implícita. As fórmulas de derivação da tabela 2.4 podem também ser obtidas derivando diretamente as expressões logarítmicas da tabela 3.1. Deixamos os detalhes para o leitor.
3.4 Extensão às variáveis complexas
Identidades similares das identidades (3.1) são conhecidas para as funções trigonométricas circulares. Mas isto exigirá o uso de números complexos. Além disso, modelos matemáticos que representam fenômenos físicos são constantemente usados para estudar e conhecer esses fenômenos — e em várias situações — a representação desses fenômenos exige a utilização de números complexos juntamente com funções trigonométricas. Em virtude disso, apresentaremos nesta seção como são definidas as funções trigonométricas circulares e hiperbólicas de uma variável complexa.
Usando as séries de potências das funções trigonométricas, desenvolvidas na seção anterior, vamos construir as funções trigonométricas de variáveis complexas. Na seção 3.1, vimos que
para todo .
Observe que o lado direito destas igualdades faz sentido se for um número complexo, desde que a série seja convergente para este número complexo. Isto nos sugere que a igualdade possa ser utilizada para definir as funções trigonométricas seno e cosseno para os números complexos que tornam a série convergente. Nestes termos, se , então definimos
desde que as séries convirjam.
Precisamos determinar os valores que tornam estas séries convergentes. Para isto, recorremos ao teste da razão (Critério de D'Alembert), para garantir a convergência de séries de potências de variável complexa. A demonstração deste teorema pode ser encontrada em algum texto de Variáveis complexas. Recomendamos [11, Zill].
então a série é absolutamente convergente (e, portanto, convergente).
A série de potências (3.12) converge qualquer que seja , pois
para qualquer . Analogamente para as séries de potências em (3.13), (3.14) e (3.15).
Naturalmente as definições (3.12)-(3.15) não são muito cômodas para trabalharmos. Vamos então tentar modificar estas expressões para redefinir seno e cosseno de números complexos em termos de funções reais de variável real. Independente de modificarmos estas expressões, os membros na direita destas igualdades são números complexos e então o que esperamos é que possamos reescrever a série de potências como sendo um número complexo mais simples de ser manipulado, dado na forma tradicional com .
Comecemos então com a identidade (3.12), colocando , com . Temos então
Usando a fórmula da expansão binomial para o termo , podemos reescrever (3.16) como
O próximo lema será útil para trabalhar com o somatório duplo do segundo membro desta última igualdade.
vamos separar o caso do somatório externo e depois os casos do somatório interno. Desta forma, para qualquer que seja , obtemos
Separando novamente os temos em do somatório interno, temos
exatamente como desejado.
Usando agora repetidamente este lema temos que
sen | ||
e assim sucessivamente. Desta forma, obtemos
e usando o fato de que e que , então temos que
Temos portanto uma definição alternativa e mais elegante para a definição do seno de um número complexo . Definição esta que será também útil para os nossos propósitos. Não estamos interessados em repetir o procedimento anterior, mas ele pode ser aplicado também às funções cosseno, senho hiperbólico e cosseno hiperbólico para obter expressões mais simples. Como não repetiremos o processo anterior apenas enunciaremos as expressões finais na próxima definição.
Vamos analisar um pouco mais estas funções e verificar que elas possuem propriedades similares às funções trigonométricas com argumentos reais. É natural esperar por isto, pois extensões não devem desorganizar o que já estava “funcionando”. Comecemos com os casos circulares.
Vamos determinar as raízes das funções seno e cosseno. Queremos então determinar os valores de para os quais . Nestes termos queremos determinar os valores (reais) de e tais que
Da igualdade de números complexos temos que
Da primeira equação, como para todo , então resta que . Temos assim que para qualquer . Com estes valores de na segunda equação temos que e então resta que donde obtemos . Assim,
para qualquer , exatamente como no caso real.
Analogamente para determinar os valores de tais que , temos que encontrar os valores reais de e tais que
e da igualdade de números complexos
Como para todo , da primeira equação resta que e então para qualquer . Como , substituindo na segunda equação vem e, portanto, . Assim,
para qualquer , também como no caso real.
Dessa forma, as demais funções trigonométricas circulares com argumentos complexos são definidas, em termos destas duas, como no caso de variável real, respeitando o domínio de definição. São portanto,
para todo | ||
para todo | ||
para todo | ||
para todo |
Podemos facilmente verificar, pelas igualdades (3.17) e (3.18), a validade para o caso complexo de identidades conhecidas para o caso real, tais como
e | |
e | |
e |
dentre muitas outras.
Uma consequência direta da definição das funções seno e cosseno por série de potência é que estas funções são analíticas no domínio de convergência da série, isto é, no plano complexo todo. Sendo assim, estas funções satisfazem as condições de Cauchy-Riemann em todo o plano complexo e isto nos dá uma forma rápida para determinar as derivadas destas duas funções. Para um estudo mais aprofundado sobre funções analíticas e as condições de Cauchy-Riemann pode-se consultar algum texto sobre variáveis complexas. Recomendamos [11, Zill].
Por hora basta saber que se e é uma função analítica em uma região do plano complexo, então
para todo nesta região.
Considerando , temos e e então
Também, se então e e, dessa forma,
As derivadas das funções seno e cosseno de variável complexa são então respectivamente o cosseno e o oposto do seno, exatamente como no caso real. Já que as regras de derivação para funções complexas são as mesmas para funções reais, isto é,
então as derivadas das demais funções trigonométricas circulares, são também iguais às derivadas obtidas no caso real. São portanto
respeitados os domínios de definição.
Além disso, as identidades obtidas e permitem estabelecer uma correspondência entre as funções trigonométricas circulares e as suas respectivas hiperbólicas. As correspondências das demais funções trigonométricas ficam
Vamos estudar outras propriedades das funções trigonométricas hiperbólicas de variável complexa. Comecemos pelas raízes destas funções. Queremos determinar os números complexos tais que . Nestes termos devemos encontrar números reais e tais que
e da igualdade de complexos, e devem satisfazer
Da segunda equação, como para todo , então devemos ter e, portanto, para . Com estes valores de na primeira equação, resta que e então . Temos assim que
para . Observe que estas raízes são complexas e que a única destas raízes que é real, é , que coincide com a única raiz real da função seno hiperbólico a argumento real.
Agora vamos determinar tal que . Da identidade (3.20), queremos determinar os valores reais de e que satisfazem
Como então da primeira equação segue que e, portanto, para . Com estes valores de na segunda equação temos que e então . Segue que
para . Dentre estas raízes complexas não existe nenhuma raiz real, o que ratifica a não existência de números reais tais que .
As demais funções trigonométricas hiperbólicas de variáveis complexas são definidas em termos de seno e cosseno como no caso real, restritas ao domínio de definição. Isto é,
para todo | ||
para todo | ||
para todo | ||
para todo |
As definições de seno e cosseno hiperbólicos em termos de séries de potências, convergentes em todo o plano complexo, nos diz que estas funções são analíticas em todo o plano complexo e então podemos determinar facilmente as derivadas destas funções. Considerando que e que temos
exatamente como no caso de variáveis reais.
Analogamente, para a função , temos
também como no caso real. Considerando ainda que a regra de derivação para o quociente de funções de variáveis complexas é idêntica à regra de derivação para o quociente de funções de variáveis reais, então temos que
com a devida restrição do domínio de definição. São as mesmas fórmulas de derivação que as funções trigonométricas hiperbólicas de variáveis reais.
Podem ainda ser definidas as funções trigonométricas circulares e hiperbólicas inversas a argumentos complexos. Não vamos nos estender neste aspecto, em virtude de que o caso complexo não é o foco do nosso interesse. Além disso, entraríamos no campo das funções multivalentes, isto é, funções que assumem mais de um valor para cada . Esta categoria de funções foge do conceito de função de um curso de Cálculo Diferencial e Integral.
3.5 Fórmulas exponenciais para funções trigonométricas circulares
Nesta seção, obteremos fórmulas exponenciais similares às identidades em (3.1) para as funções trigonométricas circulares. Mais precisamente, provaremos que
Observe que o lado direito destas igualdades envolve a função exponencial de variável complexa. Precisamos definir a função exponencial de variável complexa e o faremos como na seção anterior onde definimos as funções trigonométricas de variáveis complexas. A expansão em série de potências da função , para , é
Mas a série de potências do lado direito da igualdade faz sentido se for um número complexo que torne a série convergente. Definimos então por esta série de potências a função exponencial de variável complexa dada por
para todo tal que a série seja convergente.
De acordo com o teste da razão (Teorema 3.9), esta série de potências é convergente em todo o plano complexo, já que
para qualquer .
Esta série é importante, porém, dificulta o trabalho com a função . Como de costume, vamos reescrever esta série em termos mais agradáveis. Mais precisamente, já que o lado direito da série de potências é um número complexo, esperamos poder escrever este número complexo na tradicional forma algébrica com .
Tomando então com , aplicando a expansão binomial, podemos reescrever a função exponencial na forma
O lema a seguir nos ajudará a trabalhar com o somatório duplo do segundo membro desta última igualdade.
vamos separar o caso do somatório externo e depois os casos do somatório interno. Desta forma, para qualquer que seja , obtemos
como desejado.
Usando agora repetidamente este lema, temos que
e assim sucessivamente. Desta forma, obtemos
e usando o fato de que quando é par, temos que
e quando é impar,
então podemos separar o último somatório nas suas parcelas com par e com ímpar e obtemos
Formalmente, temos então uma definição alternativa para a exponencial de um número complexo sem o uso explícito das séries de potência.
Agora estamos prontos para obter as identidades em (3.21). Dado , temos desta última definição que
e também
Somando estas duas últimas igualdades, temos
e subtraindo a segunda da primeira, temos
Segue portanto que
Estas duas igualdades são as identidades exponenciais para as funções trigonométricas circulares e são válidas para valores reais de . Obviamente combinando estas duas fórmulas, podemos deduzir fórmulas exponenciais para as outras funções trigonométricas circulares. São elas
respeitados os domínios de definição das funções.
3.6 Fórmulas logarítmicas para as funções trigonométricas circulares inversas
Podemos também, como no caso hiperbólico, escrever as funções inversas das funções trigonométricas circulares em termos do logaritmo. Isto porque a função logaritmo de um número complexo, é a função inversa da exponencial , com uma certa restrição no logaritmo. Para conhecer mais sobre esta restrição, recomendamos [11, Zill]. Por hora, é suficiente saber que , para e .
Também temos que lembrar que a conhecida “fórmula de Bháskara” continua válida para resolver equações quadráticas que envolvem coeficientes complexos. Mais precisamente, se é uma equação com e , então as soluções desta equação são dadas por
Note que não usamos o sinal , porque a função raiz quadrada (potência meio) para números complexos é bivalente, isto é, assume dois valores, que são simétricos com relação à origem e isto substitui o sinal . Veja [11, Zill] ou outro texto sobre números complexos para um estudo mais completo sobre raízes de um número complexo.
Considerando , para e , então temos a relação
e multiplicando esta igualdade por e, organizando os termos, temos
Resolvendo esta equação quadrática, em termos de , segue que
Como a raiz do segundo membro é um número real. Levando em conta que então aplicando o logaritmo em ambos os membros, obtemos
e multiplicando tudo por , segue que
Para , vale a relação , com e . Procedendo como anteriormente, multiplicamos esta relação por 2 e por . Obtemos
e resolvendo a equação quadrática
em , temos
Esta solução envolve a raiz quadrada de um número que é real e negativo, já que . Escrevemos então
e agora aplicando o logaritmo em ambos os membros, vem
já que . Multiplicando a igualdade por obtemos
Considerando agora , válida para todo e , temos
donde
Multiplicando por e organizando os termos temos a equação quadrática
Resolvendo em obtemos,
e aplicando logaritmo em ambos os membros, já que , temos
e multiplicando a igualdade por , temos
Analogamente para a cotangente inversa, temos , para todo e e vale a relação
Procedendo como no caso da tangente, chegamos a equação quadrática
que resolvida nos fornece,
Aplicando o logaritmo e multiplicando o resultado por , chegamos a
Considerando agora , para todo e . Tomamos a relação e obtemos,
Multiplicando a equação por e reorganizando os termos obtemos
que resolvida em nos leva a
A raiz quadrada do segundo membro tem no radicando um número real negativo, já que . Escrevemos então
e temos
ou ainda,
Finalmente, para , fazendo para todo e . Temos então
e então
Resolvendo em , vem
e aplicando o logaritmo e uma multiplicação por , temos
Organizando as fórmulas logarítmicas, temos a tabela abaixo.